Sustentabilidade como base da
inovação de pequenas empresas.
No início de maio, dois estudos divulgaram
notícias alarmantes do provável colapso do manto de gelo da Antártida
Ocidental, que elevaria o nível do mar em mais de 4,5 metros. Pesquisadores
renomados, como James Lovelock e Jared Diamond, já anunciaram seu pessimismo
frente ao futuro da humanidade. Especialistas da indústria demonstram ceticismo
diante da substituição dos combustíveis fósseis por renováveis. Estes, mesmo
com crescimento acelerado, representariam somente 20 a 38% do total de energia
produzida em 2035, de acordo com os cenários da International Energy Agency
(IEA).
A despeito das previsões negativas, o mundo se
encontra, hoje, em uma situação de grandes mudanças tecnológicas, sociais,
ambientais e econômicas. Vários especialistas, aproveitando o conceito de
Carlota Perez e Christopher Freeman, consideram que estamos entrando em uma
sexta “grande onda de inovação”, após aquela baseada em redes digitais,
biotecnologia e tecnologia da informação. Como nas ondas passadas, esse momento
tem o potencial de alterar significativamente as relações econômicas e sociais
no mundo, por meio de novas tecnologias sustentáveis e uma filosofia de
produtividade radical dos recursos ao nosso dispor.
Diversos estudiosos, como C. K. Prahalad, apontam
a sustentabilidade como peça fundamental da inovação. Reduzir a quantidade de
matérias-primas usadas na produção ou repensar processos para eliminar o
impacto ambiental de certas substâncias se traduz, cada vez mais, em melhoria
nos indicadores financeiros da empresa. Em um futuro próximo, as empresas que
não adotarem práticas sustentáveis não conseguirão mais competir no mercado.
As pequenas empresas serão essenciais nas
mudanças por vir. Sua agilidade em desenvolver e aproveitar novas tecnologias e
modelos de negócios as coloca um passo à frente das corporações já
estabelecidas. Não é nada surpreendente que os grandes players implementem
políticas de inovação aberta, visando aproveitar o know-how e a rapidez de pequenas
empresas inovadoras. Alternativamente, criam uma divisão dentro da própria
companhia, gerando uma entidade nova, pequena e ágil, capaz de competir no
mercado sem as restrições da organização-mãe.
Além disso, os pequenos negócios podem facilmente
pular etapas no processo gradual de adoção de práticas sustentáveis. Os grandes
começam a enxergar a sustentabilidade por meio de oportunidades encontradas no
compliance às exigências ambientais e sociais. Aos poucos, ganham confiança e
continuam seu processo de aprendizagem, desenvolvendo eventuais modelos
sustentáveis de negócio e, finalmente, plataformas que revolucionarão a lógica
dominante de uso de recursos atuais. As MPE não passam necessariamente por esse
processo e podem oferecer novos modelos de negócio ou mesmo novas plataformas
no início de sua atuação.
Vamos usar o exemplo de diagnóstico portátil por
imagem. A General Electric (GE) apresentou seu Vscan, aparelho portátil de
ultrassom, em 2010. Sua pequena concorrente, MobiSante, lançou o Mobius SP1
System, produto similar, mas com uso de smartphone separado, em 2011. Ambos
possuem o potencial de revolucionar o setor de tratamento médico, pois oferecem
diagnósticos por imagem a 60% da população mundial que não os usufrui por conta
dos custos elevados e da imobilidade da tecnologia vigente. No entanto,
enquanto a GE passou e passa por um longo processo de repensar sua atuação no
mercado e adotar novos modelos de negócio, a MobiSante iniciou suas atividades
em 2009.
No Brasil, podemos citar como exemplo a 100’t
Inteligente, que produz móveis personalizados com papelão reciclável. A BB
Brindes lançou sua Linha Green, produtos promocionais fabricados com resíduos
de casca de coco, madeira de reflorestamento e embalagens longa vida. A
Tecverde adaptou uma tecnologia alemã para casas pré-fabricadas que reduz as
emissões de dióxido de carbono em até 80% e já construiu mais de 300 moradias
pelo país. Como um último exemplo, destaca-se a Estação Resgate, que recicla
resíduos da construção civil, transformando-os em areia, brita e outros
produtos para o setor.
E a lista é, sem dúvida, muito mais longa do que
nossos poucos exemplos. Em um estudo da CIMA, AICPA e CICA (todas organizações
de contadores) de 2011, no Canadá, Estados Unidos e Reino Unido, mostrou-se que
um terço das pequenas e médias empresas possui uma estratégia de
sustentabilidade, com outros 23% anunciando sua vontade de formulá-la nos dois
anos seguintes ao estudo. Focar a sustentabilidade não somente traz benefícios
financeiros como também aumenta a lealdade dos empregados e melhora as relações
com consumidores e fornecedores.
O caminho nem sempre é fácil. Com recursos
humanos escassos, muitas empresas pequenas não possuem o conhecimento ou os
meios para adotar uma estratégia sustentável nos seus negócios. Muitas dependem
da visão do empreendedor, que aproveita ou cria oportunidades para produtos ou
serviços de menor impacto ambiental ou maior impacto social. Em alguns casos
mais extremos, o próprio crescimento da empresa não é tão importante quanto a
aceitação por seus pares de determinadas ideias ou visão de como o mundo
deveria ser.
Ao contrário das organizações lideradas por esses
visionários, na maioria das situações, é no começar pequeno que as coisas
avançam. O primeiro passo é entender o que significa sustentabilidade para a
organização, identificando as áreas nas quais o impacto de suas atividades é
maior, lembrando que sustentabilidade não deve ser limitada ao meio ambiente. A
empresa deve se perguntar como ser um bom cidadão corporativo para o benefício
dos seus empregados, consumidores, fornecedores e outros atores afetados por
suas atividades.
O segundo passo é identificar e implementar
mudanças. Uma empresa não se torna sustentável no vácuo. Existem redes
empresariais e organizações que ajudam MPE nesse processo. É por meio delas que
se pode ter uma ideia inicial de quais atividades seriam interessantes adotar.
Comunicação, tanto dentro quanto fora da empresa, é essencial, bem como a
definição de metas claras e responsabilidades para membros-chave da empresa –
sobretudo os tomadores de decisão.
O passo final consiste no investimento para o
futuro, lembrando que a sustentabilidade nem sempre requer grandes quantidades
de capital. Para a maioria, o investimento se dará no tempo da equipe gestora
em sua capacitação, comunicação e implementação de um modo novo de agir para a
empresa.
Cabe destacar, por fim, a importância do governo
em fornecer as condições necessárias para que pequenas empresas possam, de
fato, trilhar caminhos mais sustentáveis. Sem dúvida, adotarão práticas
inovadoras para conseguir sobreviver em um ambiente cada vez mais competitivo,
participando de novos nichos de mercado. Mas apoio na forma de capacitação,
linhas creditícias adequadas, centros de incubação especializados, dentre
outros, serão essenciais para que a sustentabilidade não se limite a alguns
poucos visionários, mas seja adotada por toda a comunidade empresarial
brasileira.
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Microempresas e confira os estudos de caso, dicas e opiniões de especialistas.
* Ruy Quadros
é professor titular em Gestão Estratégica da Inovação na Unicamp. André Neiva
Tavares é economista pela Universidade de Brasília (UnB), com mestrado em
inovação e empreendedorismo pela BI – Norwegian Business School. Ambos atuam
como consultores da Innovarelab Pesquisa e Consultoria.
Fonte: Ideia
Sustentável
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