Menos fome no mundo e o desafio
da imprensa.
por Mario
Lubetkin*
A América Latina e o Caribe exibem progressos muito
rápidos no combate à fome, particularmente no sul do continente. Foto:
http://www.shutterstock.com/
Roma, Itália, outubro/2014 – Costuma-se dizer que
as boas notícias interessam menos ao público do que as más, e que por isso os
meios de comunicação são inundados por informações sobre desgraças e
catástrofes humanas ou naturais.
Felizmente, há exceções: o informe lançado no dia
16 de setembro pela Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a
Agricultura (FAO), que registra uma importante redução da fome no mundo, teve
uma vasta divulgação internacional com mais de dois mil artigos publicados,
inclusive nas grandes mídias.
Algumas das matérias expressaram surpresa sobre
esse avanço contra a fome, porque existia um estado de opinião que supunha um
aumento da miséria e da fome no mundo.
O êxito de mídia correspondeu à importância da
notícia, não só pelo avanço em si, mas também por revelar a tendência para uma
posterior diminuição da fome.
De fato, recente estimativa da FAO indica que a
redução global da fome continua. Para o período 2012-2014 calcula-se o número
de pessoas cronicamente desnutridas em 805 milhões, cem milhões a menos do que
na década anterior e 209 milhões a menos do que no período 1990-1992.
Um aspecto que não foi suficientemente analisado
pelos veículos de comunicação é que 63 países já superaram o primeiro dos
Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODM), de reduzir a fome pela metade no
período 1990-2015, e que são numerosos os países que ainda têm um ano para
atingir essa meta.
Na verdade, apesar do progresso alcançado, há
marcadas diferenças entre as diferentes regiões.
A África subsaariana é a região do mundo que sofre
mais fome e só registrou modestos avanços nos últimos anos, já que uma em cada
quatro pessoas ainda sofre desnutrição. Em vários países do norte da África, a
situação é muito melhor e os níveis de desnutrição são baixos.
Na Ásia, a região mais povoada do planeta,
encontra-se o maior número de famintos, também com diferenças internas: poucas
melhoras na Ásia meridional, bons avanços na Ásia oriental e no Sudeste
Asiático.
A América Latina e o Caribe exibem progressos muito
rápidos, particularmente no sul do continente.
Naturalmente, uma das principais causas desses
resultados é o estímulo das políticas públicas, algumas originais e outras
inspiradas em casos de sucesso, como o programa Fome Zero do Brasil.
Mas vemos que na guerra contra a fome só se venceu
algumas batalhas e ainda temos um longo caminho pela frente.
Para cantar vitória faltam mais esforços e melhor
coordenação entre os mesmos atores que já tiraram da miséria milhões de
pessoas: governos e organizações internacionais, os atores não estatais, a
opinião pública e quem a informa, os meios de comunicação.
Então, como informar sobre esses processos, cuja
tendência é claramente positiva para os destinos da humanidade, e não se
limitar a publicar os dados que os informes das organizações internacionais
apresentam sobre a situação?
A resposta está exatamente ali, esses números não
podem ser lidos como um acontecimento pontual, mas como um processo de mudanças
com múltiplos atores, públicos e privados, para uma total compreensão.
Por que a mídia não dá mais atenção a esses temas
que cada vez se colocam com mais força na agenda global informativa? Quem pode
pôr em dúvida que a segurança alimentar, as perdas pelos desperdícios de
alimentos, ou as políticas de nutrição não sejam assuntos de interesse para a
opinião pública internacional?
Somos conscientes das gigantescas mudanças que
ocorrem no campo da comunicação, somados aos efeitos que a profunda e
prolongada crise econômica desfechou a inúmeros veículos de comunicação.
Menos meios de comunicação escritos, jornais com
menos páginas, menos jornalistas nas redações, multiplicação dos meios digitais
multimídia, dificuldades dos jornalistas em enfrentar novos temas em
profundidade pelos limites dos processos de formação nas universidades talvez
sejam alguns dos pontos que devem ser levados em consideração na presente
situação.
Isso está presente na atual geração, mas, sobretudo
nas novas gerações que terão a responsabilidade de informar mais e melhor sobre
esses temas.
Em poucas semanas haverá um novo desafio de
comunicação, a Conferência Internacional sobre Nutrição, a segunda após 22
anos, que acontecerá em Roma, entre 19 e 21 de novembro.
A convocação da conferência afirma que apenas se
comprometer não é suficiente, é apenas o começo. A conferência desenhará o
contexto para que os países possam transformar seus compromissos em ação e em
impacto. Não se poderia ter escolhido uma oportunidade melhor do que esta para
essa reunião.
Este é o momento em que os governos negociam a
segunda série dos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODM), denominados
Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), que começarão a ser aplicados
no próximo ano, precisamente para erradicar a fome e a miséria no mundo.
É evidente que também neste caso não se trata
apenas de informar sobre o desenvolvimento da conferência, mas também de
enfrentar os grandes nós deste debate estratégico para o crescimento de
sociedades mais sadias e equilibradas, na qual a responsabilidade pública dos
governos é chamada a desempenhar um papel determinante. Envolverde/IPS.
* Mario Lubetkin é
diretor de Comunicação Corporativa da Organização das Nações Unidas para a
Alimentação e a Agricultura (FAO).
Fonte: ENVOLVERDE
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