sábado, 6 de dezembro de 2014

O Sul pede clareza no financiamento e na adaptação na COP 20.
por Diego Arguedas Ortiz, da IPS
Uma das sessões plenárias da jornada inaugural das negociações da 20ª Conferência das Partes da Convenção Marco das Nações Unidas sobre a Mudança Climática, na capital do Peru. Foto: Diego Arguedas Ortiz/IPS.

Lima, Peru, 2/12/2014 – Durante a 20ª Conferência das Partes (COP 20) da Convenção Marco das Nações Unidas sobre a Mudança Climática, que começou ontem e terminará no dia 12 na capital peruana, representantes de 195 países e centenas de membros da sociedade civil buscam concertar os pontos mais importantes de um novo tratado mundial destinado a frear o aquecimento global.

As delegações oficiais e da sociedade civil organizada do Sul em desenvolvimento têm os olhos voltados para o avanço de um rascunho para conseguir um acordo vinculante sobre redução de emissões de dióxido de carbono, que deve ser assinado dentro de um ano. A expectativa recai, sobretudo, nos compromissos que os países industrializados assumirem, como financiar a luta contra a mudança climática, e na inclusão de metas vinculantes para reduzir a vulnerabilidade atual a esses fenômenos, segundo reconheceram seus representantes à IPS.

“De Lima tem de sair um texto contendo elementos que assentem as bases do acordo de 2015. Será assinado no próximo ano, mas os elementos têm de estar aqui, como, por exemplo, as contribuições dos países e do que vão tratar”, explicou à IPS o argentino Enrique Maurtua, assessor em política internacional do capítulo latino-americano da organização Climate Action Network (CAN). “Essas contribuições têm de ser equitativas e incluir indicadores como necessidades históricas, adaptação ou necessidades de desenvolvimento dos países”, assegurou.

A COP 20 da Convenção Marco das Nações Unidas sobre Mudança Climática (CMNUCC) parte de um reconhecimento cada vez mais discutido: o ritmo de vida e o modelo de desenvolvimento atual representa pesadas emissões de gases-estufa na atmosfera, que aquecem o planeta.

Como reduzir esse aquecimento e o que fazer com os danos já produzidos são duas das perguntas mais importantes na cúpula climática aberta ontem nas instalações temporárias levantadas no terreno do Quartel General do Exército em Lima, conhecido como “Pentagonito” (Pentagoninho).

Maurtua destacou que essas denominadas “contribuições previstas e determinadas em nível nacional (INDC) têm de ser suficientemente fortes para se seguir o caminho para conter o aumento global das temperaturas em dois graus centígrados, e não em quatro ou seis, que é para onde apontamos agora”.

Segundo o ritmo atual de consumo dos humanos, até 2100 o planeta seria quatro graus mais quente do que nos anos anteriores à revolução industrial, antes que começasse a maior parte das emissões. Isso provocaria aumentos drásticos do nível do mar, mudanças na produtividade dos solos, no tamanho das geleiras e na biodiversidade, sendo que os primeiros a serem afetados seriam os que têm menores emissões: os países do Sul.

Os cientistas identificaram que só um cenário onde o aumento não seja maior do que dois graus pode prevenir alterações climáticas muito bruscas. A redução das emissões de gases-estufa é o caminho escolhido para alcançar esse limite. Esse objetivo se consegue mediante a diminuição do consumo de combustíveis fósseis, o uso de energias limpas e o desenvolvimento de um estilo de vida baixo em emissões.

O novo tratado substituirá, a partir de 2020, o Protocolo de Kyoto, assinado em 1997 e em vigor desde 2005, e deverá ser rubricado na COP 21, que acontecerá em dezembro do ano que vem, em Paris. “Seu rascunho deve ser acordado aqui, deve marcar o fim dos combustíveis fósseis até 2050 e deve acelerar a mudança para energias limpas e renováveis”, destacou Martin Kaiser, do Greenpeace. “Não se trata de “energias como a nuclear que é cara, centralista e perigosa”, enfatizou esse ativista na abertura da COP 20.

Governos e sociedade civil do Sul em desenvolvimento concordam que é necessário buscar mecanismos para adaptação às mudanças climáticas, algumas delas já consideradas irreversíveis. “É muito importante o tema da adaptação. Esta tem que ter o mesmo peso que tem a mitigação. Basicamente é reforçar o vínculo entre ambas. Já temos que fazer adaptação, mas, quanto mais se atrasa a mitigação, mais teremos que nos adaptar. São igualmente importantes e isso também tem que estar refletido”, detalhou Maurtua.

Em um informe divulgado na véspera da abertura da COP 20, a organização Oxfam recordou que a mitigação da mudança climática é cara, bem como a adaptação ao fenômeno. Apenas nos países subsaarianos são necessários US$ 62 bilhões para a adaptação, afirma o estudo.

“O que podemos esperar, o que os países em vias de desenvolvimento estão buscando nas contribuições nacionais, é uma garantia de que o financiamento terá lugar no encontro, em algum lugar, porque isso é algo que não estamos vendo no momento”, pontuou à IPS a assessora em mudança climática da Oxfam, Kiri Kanks.

A ativista reconhece que existe um debate sobre o modo de implantar o financiamento da luta contra a mudança climática, mas, “seja nesse acordo, nas contribuições ou em algum outro lugar, há uma necessidade de se fazer uma paridade entre mitigação e seu financiamento”.

Durante séculos os países industrializados queimaram mais combustíveis fósseis e desmataram com maior velocidade, por isso suas emissões históricas são maiores do que as dos países do Sul em desenvolvimento. Por isso, se convencionou que as nações industrializadas financiassem o Fundo Verde para o Clima, com US$ 100 bilhões até 2020. Mas a contribuição para esse fundo é mínima até agora, segundo ativistas e delegações oficiais.

“É necessário que os negociadores cheguem a acordos para o rascunho do novo protocolo. Entre eles um mecanismo para rever as contribuições, que revise tanto os níveis de ambição como os de emissões”, opinou Tasneep Essop, do Fundo Mundial para a Natureza. “Queremos ver um mecanismo que traduza essa revisão em termos de ambição. Queremos também ver a adaptação dentro do texto, mas com o apoio financeiro correspondente”, acrescentou.

Essop ressaltou que a sociedade civil chegou a Lima fortalecida por mobilizações em massa nos meses anteriores, com marchas ocorrendo em cidades de todo o mundo pedindo medidas diante da mudança climática. Também disse que são animadores o anúncio conjunto da China e dos Estados Unidos, e o da União Europeia, no dia 12 de novembro, com compromissos sobre redução de emissões.

Entretanto, Essop considera que falta um compromisso que permita pensar que em 2020 começarão medidas para responder ao desafio do modelo de desenvolvimento que a mudança climática impõe.

Maurtua compartilha a posição de que falta compromisso, em particular financeiro. Segundo esse especialista do CAN latino-americano, “há contribuições de vários países comprometidos, que somam US$ 9,3 bilhões. Supunha-se que essas contribuições tinham que já ter alcançado entre US$ 10 bilhões e US$ 15 bilhões, que nos fazem falta. No rascunho de Lima tem de estar estabelecido o caminho para conseguir os US$ 100 bilhões até 2020, para implementar o novo tratado climático”.


Fonte: Envolverde

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