sexta-feira, 23 de outubro de 2015

O futuro dos ganhos sociais na América Latina.
Um camponês mostra sua produção na aldeia aymara de Nasa Q’ara, também conhecida como Nazacara, no departamento de La Paz, na Bolívia. Foto: Jessica Belmont/Fonplata.

Por Juan Notaro*

Santa Cruz de La Sierra, Bolívia, 6/10/2015 – Em um momento em que as maiores economias da América Latina se encontram em recessão ou em franco processo de paralisia, e os dados do desemprego vão lentamente aumentando, muitos se perguntam o que acontecerá com os ganhos sociais que a região soube gerar nos últimos 15 anos. Algo mais alentador espera-se de países de porte pequeno e médio com Bolívia, Paraguai e Uruguai, que continuarão crescendo, inclusive o primeiro acima dos 4%, o que agrega um elemento de moderado otimismo ao quadro regional.

Segundo a Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (Cepal) e o Banco Mundial, apesar de 80 milhões de latino-americanos terem conseguido fugir da pobreza e a classe média ultrapassar os 150 milhões de pessoas em 2013, cerca de 40% dos latino-americanos vivem em situação de vulnerabilidade. São os que têm renda entre US$ 4 e US$ 10 diários, e que, em caso de um choque econômico, podem retornar a uma posição precária.

Há quem prognostique uma tempestade perfeita, devido à queda dos preços das matérias-primas incluindo o petróleo, a descendente demanda chinesa diante da desaceleração parcial de sua economia, o potencial aumento das taxas de juros (novamente adiado) por parte do Federal Reserve norte-americano e ao fato de que, com exceção dos Estados Unidos, os países industrializados ainda registram um magro progresso econômico. Argumentam que “a festa acabou”, que a bonança da última década foi produto de uma mera conjuntura internacional favorável e nada mais.

Desconhecem que a região, especialmente os países com os quais trabalho diretamente no Fonplata (Fundo Financeiro para o Desenvolvimento dos Países da Bacia do Prata) – que são Argentina, Bolívia, Brasil, Paraguai e Uruguai –, instrumentou um processo de renovação tecnológica na produção agropecuária e mineradora, que lhes permitiu captar a demanda crescente e fazê-lo de forma competitiva no mercado global. Também se esquecem de que, embora ainda insuficiente para os níveis exigidos, o investimento em infraestrutura viária teve um significativo crescimento.
Juan Notaro, presidente-executivo da Fonplata. Foto: Fonplata.

Segundo dados da Direção Nacional Viária argentina, por exemplo, só em 2011 foram investidos US$ 3,065 bilhões na construção de novas autopistas e estradas concessionadas nesse país. A Bolívia, porém, destinou US$ 7,8 bilhões a investimentos em infraestrutura – principalmente viária – entre 2011 e 2015, segundo fontes oficiais.

Naturalmente que há necessidade de diversificar mais a produção e os mercados e investir mais em inovação e adequação da educação pública aos desafios do mundo em que vivemos. Agregar valor à produção de matérias-primas é algo desejado. Porém, são processos de longo prazo, que requerem um ajuste nas cadeias de comércio internacional e implicam uma série de reformas internas nos países em vários setores, desde a educação, passando pelas alianças público-privadas, até a eficiência na gestão do Estado.

No entanto, como evitar um retorno da pobreza e o aumento da desigualdade? Os bancos de desenvolvimento que trabalham na região aportam uma média de US$ 35 bilhões anuais em apoio aos setores público e privado regionais.

Nessa conjuntura é duplamente crítica a assistência desses organismos em áreas com claro impacto social, particularmente na manutenção e geração de emprego, bem como em preservar os progressos de inclusão conseguidos na última década. O Fonplata trabalha nessa direção, porque se foca nas áreas rurais e de fronteira com maior risco social e econômico. Continuar o apoio às redes de proteção social e eventualmente aumentá-lo é essencial e também é um custo eficiente.

De acordo com um recente informe do Banco Mundial, os programas de proteção social bem desenhados, como é a maioria dos de nossa região, são eficazes em relação aos custos, pois só representam entre 1,5% e 1,9% do produto interno bruto (PIB), uma cifra muito inferior ao gasto da maioria dos governos em subvenções aos combustíveis.

Em condições de maior dificuldade econômica, a capacidade das famílias de gerar renda é como estar montanha acima, já que aumentam as desigualdades em matéria de oportunidades, os riscos e as deficiências do mercado crescem, e explicam porque algumas pessoas conseguem acumular mais ativos produtivos e outros todo o contrário.

Por isso, a contribuição dos bancos de desenvolvimento é essencial para diminuir essa brecha de oportunidades e gerar um muro de proteção social que contribua para relançar o ciclo econômico.

* Juan Notaro é presidente-executivo do Fundo Financeiro para o Desenvolvimento dos Países da Bacia do Prata (Fonplata).


Fonte: ENVOLVERDE

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