sexta-feira, 13 de novembro de 2015

Humanidade na margem de erro do fracasso.
Foto: Shutterstock

Relatório das Nações Unidas mostra que, sem ampliação forte da ambição climática antes de 2030, humanidade não conseguirá conter o aquecimento perigoso da Terra neste século.

Por Claudio Angelo, do OC –

A humanidade está oficialmente na margem de erro do fracasso em cumprir a meta de limitar o aquecimento da Terra a menos de 2oC neste século. É o que revela um relatório anual do Pnuma (Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente) divulgado nesta sexta-feira (6/11).

Esse estudo, conhecido como Emissions Gap Report, avalia quão perto ou longe as políticas de clima em curso no planeta nos deixam de alcançar o objetivo dos 2oC, acordado na conferência de Copenhague, em 2009.

A edição deste ano mostra que estamos bem longe, mas já estivemos pior: os 119 planos climáticos (INDCs) apresentados por 146 países como contribuição à conferência do clima de Paris são capazes de retirar da atmosfera, em 2030, de 4 bilhões a 6 bilhões de toneladas de gás carbônico, em comparação às políticas atuais (como o Protocolo de Kyoto e a meta brasileira de reduzir o desmatamento até 2020). Isso faria com que as emissões anuais do planeta em 2030 fossem de 54 bilhões de toneladas de CO2 no melhor cenário – um crescimento de apenas 2,4% em relação às 52,7 bilhões de toneladas emitidas em 2014.

Ocorre que, para o mundo entrar numa trajetória de emissões que nos dê pelo menos 66% de chance de evitar que o limite de 2oC seja ultrapassado, seria preciso que as emissões em 2030 fossem de, no máximo, 42 bilhões de toneladas de CO2.

Ou seja, se tudo der absolutamente certo com o cumprimento das INDCs, inclusive a parte delas que está condicionada a aporte de dinheiro externo, chegaremos a 2030 com 12 bilhões de toneladas de CO2 em excesso na atmosfera para fechar a conta da estabilização do clima. É esse o gap (“lacuna”, ou “hiato”, em inglês) a que se refere o título do relatório.

Um pouco mais pessimista do que a avaliação das INDCs feita pela Convenção do Clima na semana passada, o relatório do Pnuma estima que os planos para Paris nos colocam numa trajetória de 3oC de aquecimento em 2100, pelo menos – contra 2,7oC mencionados pela Convenção.

Mais grave ainda, a própria meta dos 2oC pode já ter sido perdida. Isso porque, segundo o relatório, um “número significativo” de modelos computacionais usados no estudo para calcular a trajetória de temperatura simplesmente não consegue produzir cenários futuros de 2oC se as emissões em 2030 forem maiores do que 55 bilhões de toneladas de CO2.

À primeira vista, estamos dentro da meta, com 54 bilhões de toneladas previstas em 2030. Só que a relação entre INDCs e nível de emissão futura carrega um monte de incertezas, expressa em uma margem de erro: a média é de 54 bilhões de toneladas, mas o valor real está em 52 bilhões a 57 bilhões. No último caso, seria economicamente inviável baixar a curva de emissões do planeta para um cenário compatível com os 2oC. A menos que muita coisa aconteça bem antes de 2030.

“Adiar esforços rígidos de mitigação até 2030 tornaria a transição para níveis de emissões de longo prazo em linha com o objetivo de 2oC significativamente mais difícil”, afirma o relatório, num eufemismo.

O Gap Report, portanto, reforça a ideia, já expressa por um grande estudo internacional divulgado no último mês, de que a única solução possível para os 2oC é que o acordo de Paris produza um mecanismo internacional de aumento periódico da ambição das metas – o chamado “torniquete” (“ratchet”, em inglês) – que possa entrar em ação a partir de 2020. Esperar até 2030 para ajustar as INDCs será tarde demais para o clima.

Mesmo assim, diz o estudo, para que essa ação pós-2020 siga uma trajetória de custo mínimo, será preciso lançar mão de tecnologias de “emissões negativas”, como o chamado bio-CCS (produção de bioenergia com captura e armazenamento de carbono). Alguns pesquisadores chamam essas tecnologias de “ficção científica”.

Segundo o estudo do Pnuma, existe potencial técnico de mitigação no mundo capaz de apertar o torniquete em até 10 bilhões de toneladas. Há muita incerteza sobre o potencial dessas tecnologias, por um lado; por outro, há várias opções que não são consideradas pelos estudos sobre potenciais de mitigação, e que poderiam fazer com que a capacidade de cortar carbono seja ainda maior do que isso.

REDD+

Além disso, o Gap Report traz um recado que o Brasil faria bem em escutar: as florestas podem se tornar uma tábua de salvação planetária para fechar o hiato de emissões de forma rápida e relativamente barata: “O potencial teórico de atividades de mitigação relacionadas a florestas nos países em desenvolvimento é estimado em até de 9 Gt CO2e [bilhões de toneladas de gás carbônico] em 2030”, diz o estudo.

É o chamado Redd+, o mecanismo de redução de emissões por desmatamento e degradação florestal.

Para fazer o Redd+ funcionar, prossegue o Pnuma, os países florestais deveriam ter prontos níveis de referencia de emissões florestais, uma estratégia nacional de Redd+ e mecanismos de salvaguardas, para que a proteção ambiental e direitos de comunidades tradicionais não sejam atropelados.


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