sábado, 21 de fevereiro de 2015

O que o acordo Índia-EUA sobre energias renováveis tem a dizer para o Brasil?
por Delcio Rodrigues*
O presidente norte-americano Barack Obama e o primeiro ministro indiano Narendra Modi firmaram um documento histórico para o combate às mudanças climáticas. Os EUA participarão de um megaempreendimento indiano de energia limpa. Não se trata apenas de um grande negócio: os números provam que este será um grande salto para que a Índia chegue a 2030 com 46% de seu setor elétrico movido pelas novas renováveis solar e eólica (36%) e pela hidroeletricidade (10%).

Para termos uma ideia do tamanho do salto Indiano para as energias limpas e renováveis: os 160 GW de energia renovável que a Índia quer instalar nos próximos sete anos são 1,2 vezes mais que toda a capacidade de geração elétrica que o Brasil tem instalada a partir de várias fontes de energia nas suas 3.599 usinas.

Respeitando as proporções entre as populações e as capacidades dos setores elétricos da Índia e do Brasil, o exemplo do primeiro-ministro-empreendedor indiano deveria inspirar os planejadores brasileiros do setor de energia.

Índia e Brasil são dissemelhantes em muitos aspectos, inclusive no tamanho, no crescimento recente e na participação das energias renováveis em seus setores elétricos: enquanto a capacidade de geração de eletricidade da Índia mais que dobrou nos últimos dez anos, atingindo 234,6 GW, no Brasil aumentou muito menos, 48%, atingindo 134 GW. Enquanto a hidroeletricidade somada às novas energias renováveis (solar e eólica) representam na Índia somente 13% da capacidade total, no Brasil a hidroeletricidade e a energia dos ventos (ainda quase não temos solar) somam quase 70% da capacidade total de geração.

Pelo acordo com a Índia, os EUA garantem metade dos US$ 200 bilhões necessários nos próximos 7 anos para instalar 100 gigawatts (GW) de energia solar e 60 GW de energia eólica até 2022.

E o Brasil, o que precisa e quer fazer? Certamente o Brasil precisa diversificar suas fontes de geração de eletricidade. Contar com a regularidade dos rios pode ser arriscado nestes tempos de mudanças climáticas, como tem mostrado a seca que o Sudeste tem atravessado nos últimos tempos. Extremos climáticos como este devem ser cada vez mais frequentes nos próximos anos.

A alternativa tradicional das termelétricas que queimam combustíveis fósseis é muito cara, como ficou claro nos preços praticados nos últimos meses no mercado livre de energia. Além disso, vai na contramão da necessária redução das emissões globais de gases de efeito estufa responsáveis pelo aquecimento global. Não nos iludamos, o Brasil vai ter que reduzir mais e mais suas emissões, assim como precisarão fazer todos os países emergentes e industrializados nos próximos anos.

O aproveitamento da energia dos ventos tem crescido bastante no país. Partindo praticamente do zero em 1997, o Brasil tem hoje 6 GW instalados e deve chegar a 15 GW em 2018. Mas isto ainda é pouco perto do que a energia eólica pode contribuir com o desenvolvimento econômico sustentável do país: nosso potencial chega a 143 GW e podemos aproveitá-lo em grande parte em prazo relativamente curto. As empresas do setor estão prontas para isto, e para criar muito mais empregos por unidade de energia do que indústrias capital-intensivas como a do petróleo, da energia nuclear e outras.

Começamos tarde com o aproveitamento da energia solar. Somente no segundo semestre do ano passado esta fonte renovável e sustentável de energia conseguiu participar de um leilão de compra da Eletrobrás, no qual foram contratados pouco mais de 1 GW. E a meta de médio prazo da Empresa de Planejamento Energético do governo federal é modesta, 3,5 GW até 2023. O Brasil tem um enorme potencial de geração de energia solar, e boas condições para construir um novo setor industrial importante, começando por contratar nos próximos anos pelo menos 1 GW solar por ano.

A exemplo do primeiro ministro Modi, o governo federal brasileiro deve apostar forte nestas alternativas porque elas ajudarão o país a afastar no futuro o risco de novos apagões por crises hídricas e contribuirão para reduzir as emissões de gases de efeito estufa do setor elétrico, gerando, ao mesmo tempo, muitos empregos de qualidade.

Que os BRICS nos inspirem!

* Délcio Rodrigues é físico e vice-presidente do Instituto Vitae Civilis.


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