quarta-feira, 22 de julho de 2015

Banheiros, uma meta de desenvolvimento mais do que pendente.
Meninas e meninos visitam os novos banheiros melhorados em sua comunidade, um dos “projetos de rápido impacto” da Operação das Nações Unidas na Costa do Marfim (Onuci), que apoiou a recuperação de escolas e sanitários em Abidjan. Foto Patricia Esteve/ONU.

Por Thalif Deen, da IPS –

Nações Unidas, 3/7/2015 – A maioria das nações do Sul está perto de cumprir as metas de desenvolvimento em matéria de saneamento, mas as mais pobres delas continuam muito atrasadas, segundo um novo documento da Organização das Nações Unidas (ONU). Uma em cada três pessoas, cerca de 2,4 bilhões no mundo, continuam não contando com instalações sanitárias e, entre estas, 946 milhões defecam ao ar livre, destaca o informe Avanços em Saneamento e Água Potável: Atualização de 2015 e Avaliação dos ODM.

O documento foi preparado de forma conjunta pelo Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef) e pela Organização Mundial da Saúde (OMS). “O que os dados mostram é a necessidade de se concentrar nas desigualdades como a única forma de conseguir um progresso sustentável”, afirmou Sanjay Wijesekera, diretor dos programas de água, saneamento e higiene do Unicef.

“O modelo global até agora tem sido os ricos tomarem a dianteira, e só quando eles têm acesso, os pobres os alcançam. Se pretendemos conseguir um acesso universal ao saneamento até 2030, precisamos garantir que os mais pobres comecem a conseguir progressos agora”, acrescentou Wijesekera.

O obstáculo pela universalização do saneamento reside nos investimentos inadequados nas campanhas para mudar comportamentos, na falta de produtos acessíveis para os pobres, bem como a existência de normas sociais que aceitam, ou até incentivam, a defecação ao ar livre. E, embora cerca de 2,1 bilhões de pessoas tenham conseguido melhores condições de saneamento desde 1990, o mundo não alcançará uma das metas dos oito Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODM) porque ainda há 700 milhões carecendo desses serviços.

Atualmente, apenas 68% da população mundial têm serviços sanitários melhorados, nove pontos percentuais abaixo da meta de 77%. Mas também cabe destacar “avanços espetaculares”, segundo disse à imprensa, no dia 30 de junho, Jeffrey O’Malley, diretor de dados da divisão de Pesquisa e Política do Unicef. Em 2015, 91% da população mundial utilizou uma fonte melhor de água potável, contra 76% em 1990. Agora, cerca de 6,6 bilhões de pessoas têm acesso a água potável melhorada.

O número de pessoas sem água potável atualmente é de 663 milhões, quase cem milhões a menos do que no ano passado. É a primeira vez que este índice fica abaixo dos 700 milhões. Este ano vence o prazo para alcançar os ODM e já se atingiu a meta do acesso a água, embora restem vários buracos, especialmente na África subsaariana. Entretanto, houve um tremendo fracasso no cumprimento da meta do saneamento. Neste ritmo, serão necessários 300 anos para que todas as pessoas da África subsaariana disponham de um banheiro, diz o informe.

Tim Brewer, analista político sobre monitoramento e responsabilidade, da organização WaterAid, com sede em Londres, disse à IPS que a meta da água foi atingida, em grande parte, graças ao fato de ter chegado onde era mais fácil. “Os mais pobres costumam ficar para trás. O que temos de fazer com os novos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), atualmente em negociação, é garantir que o índice a considerar seja o do avanço dos mais pobres”, acrescentou.

Segundo Brewer, “não podemos ter outra situação na qual parece termos êxito porque melhorou a situação dos que comparativamente estão melhores, mesmo quando milhões de pessoas ainda adoecem por beberem água contaminada ou por ambientes contaminados por fezes. Precisamos medir o acesso básico dos pobres, assim como medir outros indicadores, por exemplo, se a água é potável e acessível e se o esgoto é tratado adequadamente. É a única forma de garantirmos chegar a todos e em todos os cantos até 2030, e que os governos sejam responsáveis por suas promessas”, ressaltou.

A prática de defecar ao ar livre também se relaciona a um alto risco de atrofia, ou má nutrição crônica, que afeta 161 milhões de meninas e meninos no mundo, deixando-os com danos físicos e cognitivos irreversíveis. “Para beneficiar a saúde humana, é vital acelerar mais os avanços em matéria de saneamento, especialmente em áreas rurais e desfavorecidas”, apontou Maria Neira, diretora na OMS do departamento de Saúde Pública, Ambiente e Determinantes Sociais da Saúde.

Wijesekera, do Unicef, disse à IPS que foi fixada uma meta de saneamento ainda mais ambiciosa para os novos ODS, a fim de eliminar a defecação ao ar livre e conseguir um acesso universal a serviços sanitários. “Creio que conseguir o acesso a saneamento universal até 2030 é possível, mas somente se começarmos agora a nos concentrar nos mais pobres e mais vulneráveis”, ressaltou.

Segundo Wijesekera, “podemos aprender com os êxitos dos últimos 25 anos, e em especial dos últimos 15. Alguns países conseguiram progressos muito rápidos na área dos ODM”. Citou como exemplo que a Etiópia reduziu a defecação ao ar livre em 64% e a Tailândia fechou a brecha de acesso entre os mais ricos e os mais pobres. Para o diretor do Unicef, isso mostra que é possível quando os países reconhecem a importância de abordar as desigualdades no acesso a água, saneamento e higiene (Wash), o que deriva em benefícios para a saúde, nutrição, educação e produtividade econômica.

Consultado sobre a solução, Wijesekera afirmou à IPS que “o saneamento não é física quântica, a maioria dos países mais ricos a dão como assentada”, respondeu, e acrescentou: “nossa experiência no terreno nos países em desenvolvimento mostra que não se trata de os governos investirem dinheiro e tecnologia. Também se trata de mudar atitudes e comportamentos das pessoas, e isso leva tempo”.

O saneamento pode ser melhor atendido se houver investimento nas pessoas e nos sistemas em escala local para mudar o comportamento das pessoas, e o setor privado se envolver em oferecer produtos de boa qualidade e acessíveis, além de serviços para os pobres. Os próprios países devem estar à frente da iniciativa, bem como os doadores, as organizações internacionais e o setor privado, todos têm um papel a cumprir para oferecer fundos e experiência.

Também há maior consciência sobre a importância do saneamento como base para o desenvolvimento humano e econômico. Muitos governantes falam disso, e também altos funcionários internacionais, como o secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon, ou o presidente do Banco Mundial, Jim Yong Kim. “Precisamos traduzir o apoio de alto nível em medidas concretas para que as pessoas tenham acesso ao que é seu direito humano: água potável e saneamento adequado”, destacou Wijesekera.


Fonte: ENVOLVERDE

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