terça-feira, 1 de setembro de 2015

Sem cooperação não há desenvolvimento.
Jomo Kwame Sundaram. Foto: FAO
Por Jomo Kwame Sundaram* 

Roma, Itália, 10/8/2015 – Há um amplo consenso de que a Agenda de Ação de Adis Abeba significou uma grande decepção para as nações em desenvolvimento, bem como para outros atores que esperavam contar com os meios necessários para implantar as iniciativas de desenvolvimento nacionais e os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS).

Fica claro que o Sul, que inclui os países menos avançados, não deve esperar nenhum avanço sério no tocante ao compromisso, que já tem quase meio século, de destinar 0,7% do produto interno bruto (PIB) dos países mais ricos às nações em desenvolvimento.

E o pior é que as nações em desenvolvimento tampouco devem esperar ter uma participação significativa nos debates intergovernamentais para melhorar as capacidades tributárias globais e nacionais.

A capital da Etiópia recebeu, entre 13 e 15 de julho, a Terceira Conferência Internacional sobre o Financiamento para o Desenvolvimento, que concluiu com a Agenda de Ação de Adis Abeba.

Embora os países da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômicos (OCDE) tenham concordado em que, para que as nações em desenvolvimento possam evitar depender da ajuda externa de longo prazo, a única estratégia viável é com impostos, se negaram à iniciativa de criar um órgão intergovernamental para a cooperação internacional em matéria tributária sob os auspícios da Organização das Nações Unidas (ONU).

A capacidade de promover políticas de desenvolvimento depende fundamentalmente da disponibilidade de espaço fiscal, que depende principalmente da arrecadação interna, especialmente por meio de impostos.

Entretanto, a arrecadação tributária na maioria das nações em desenvolvimento de rendas baixa e média é pequena, representando cerca de 15% e 19% do PIB, respectivamente, em comparação com 30% dos Estados mais ricos.

O saber tributário majoritário se inclina pela ampliação da base mesmo quando as capacidades tributárias são modestas.

Assim, os impostos indiretos tenderam a aumentar, enquanto os diretos para corporações e pessoas se inclinaram à queda. Supunha-se que este último seria bom para os investimentos e o crescimento, mas a sustentação empírica dessa suposição é duvidosa.

De fato, na grande maioria dos países da África subsaariana e da América Latina a relação entre impostos e PIB paralisou ou diminuiu, bem como as tarifas alfandegárias e os direitos de importação, que representavam a maior parte da arrecadação fiscal, caíram com a liberalização comercial.

Lamentavelmente, outros impostos não cresceram de modo a compensar a diminuição dos impostos comerciais.

Existe uma necessidade urgente de reverter essa tendência, com maior compromisso para a geração de arrecadação a fim de melhorar a proteção social, criar empregos e contribuir para a sustentada recuperação econômica.

Não tem sentido as nações em desenvolvimento simplesmente tratarem de imitar as economias ricas na geração de arrecadação. Mesmo entre elas, não há um modelo único.

E, sem dúvida, não em todo o momento, pois os sistemas tributários devem evoluir com as circunstâncias econômicas. Uma dúvida fundamental é: quais impostos têm maiores probabilidades de cumprirem os requisitos de capacidade de aplicação e estabilidade?

A proporção de arrecadação fiscal em relação ao PIB pode aumentar das seguintes maneiras: ampliando a base tributária interna, reduzindo a evasão e a fraude fiscal, e encontrando novos tributos internacionais.

Não há razão para ser muito pessimista com relação aos impostos diretos, pois em muitos países as reformas fiscais melhoraram significativamente a contribuição destes para a arrecadação fiscal.

É, por certo, possível melhorar essa arrecadação nas nações em desenvolvimento aumentando a proporção de impostos diretos para os setores mais ricos cobrando sobre a renda mais progressista.

Mas deve haver maior esforço para garantir maior respeito e melhorar a arrecadação dos impostos existentes.

A queda de arrecadação decorrente da globalização é um assunto que deve ser atendido.

Há três razões para a perda de arrecadação: primeiro, os movimentos de capitais aumentam as possibilidades de evasão fiscal pela limitada capacidade das autoridades em supervisionar a arrecadação no estrangeiro, a evasão é mais fácil porque alguns governos e algumas instituições financeiras escondem de forma sistemática informação relevante.

Quando os dividendos, juros, direitos de autor e honorários de gestão não são taxados no país onde são pagos, é mais fácil passarem despercebidos ali onde estão os beneficiários.

Segundo, pode aumentar a escusa (não a evasão), dadas as diferenças internacionais em matéria tributária pela escolha de regime impositivo que o tratamento fiscal internacional da renda as empresas costuma oferecer.

A transferência do preço de bens, serviços e recursos entre as subsidiárias das companhias oferece oportunidades para deslocar a arrecadação, a fim de minimizar as obrigações tributárias.

Terceiro, a competição internacional pelo investimento direto estrangeiro levou os governos a reduzirem impostos e aumentarem concessões. Assim, as taxações que podem impor estão limitadas pela competição internacional.

Isso faz com que os governos sejam reticentes em elevar os impostos, ou os benefícios impositivos e a arrecadação por juros, temendo a fuga de capitais, embora seja sabido que as concessões impositivas têm pouco efeito no desvio de investimentos internacionais, quanto menos atraindo fluxos de capital. Por essa razão, as concessões são uma perda de arrecadação desnecessária.

Os ministros de Finanças e as autoridades fiscais das nações em desenvolvimento devem cooperar entre si e com suas contrapartes nas economias da OCDE para aprenderem uns com os outros e fechar a lacunas existentes pelo bem comum.

E, devido à enorme e crescente dívida pública que acumulam os países, bem como às condições fiscais reais e imaginárias que existem para uma sustentada recuperação da economia global, a cooperação é mais urgente do que nunca.

* Jomo Kwame Sundaram é coordenador de desenvolvimento econômico e social da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO).


Fonte: ENVOLVERDE

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