quarta-feira, 30 de dezembro de 2015

Licenciamento ambiental mais frágil.
Desastre na barragem da Samarco, em Minas Gerais, causou danos sociais e ambientais de grandes proporções. Foto: © Agência Brasil.

Por Jaime Gesisky, do WWF Brasil – 

Foi uma surpresa. Aproveitando o tenso clima político provocado pela prisão do líder do governo no Senado nesta quarta-feira, a Comissão Especial do Desenvolvimento Nacional aprovou o projeto de lei (654/2015), do senador Romero Jucá (PMDB-RR), que torna ainda mais frágil o licenciamento ambiental de grandes obras no país.

A iniciativa cria um rito especial – sumário – de licenciamento ambiental para empreendimentos de infraestrutura nos sistemas viário, hidroviário, ferroviário e aeroviário; portos; energia; telecomunicações. Os senadores retiraram da proposta a autorização de licenciamento especial para empreendimentos que explorem recursos naturais.

O argumento central de Jucá é que o projeto de lei acelera a liberação de licenças ambientais para grandes empreendimentos de infraestrutura, com um procedimento especial para obras “estratégicas e de interesse nacional”.

Conforme o texto, o Poder Executivo indicará, por decreto, obras sujeitas ao licenciamento ambiental especial. O órgão licenciador terá 60 dias para analisar o projeto e os estudos ambientais apresentados e solicitar esclarecimentos. Depois disso, terá mais 60 dias para decidir. Todo o processo levará entre sete e oito meses. O licenciamento normal, observou Jucá, pode levar até cinco anos.

O projeto recebeu 7 votos favoráveis e 2 contrários. Cristovam Buarque (PDT-DF) disse temer que o PLS 654/15 fragilize ainda mais o cuidado com o meio ambiente. O projeto diz que o descumprimento de prazos implica a aquiescência ao processo de licenciamento. “Aqui, abre uma porta para que, com qualquer ineficiência de um dos órgãos, o projeto seja aprovado mesmo que seja nocivo ao meio ambiente”, ponderou o senador.

Licenciamento em risco

Para as ONGs ambientalistas, o projeto representa, na prática, o fim do licenciamento ambiental. Na manhã desta quarta-feira, o WWF-Brasil juntou-se a diversas outras organizações civis em um manifesto contrário à aprovação do projeto de lei que cria o fast-track ambiental.

O manifesto afirma que, se o projeto de lei for aprovado, poderá ampliar os conflitos, inclusive judiciais envolvendo os empreendimentos. “O meio ambiente será objeto de maiores riscos, as populações potencialmente impactadas ficarão menos protegidas e com seus direitos ameaçados e os empreendedores terão menos segurança jurídica para operar e mais conflitos a resolver sem a intermediação do Poder Público”, diz o manifesto.

“Nem mesmo a catástrofe de Mariana – provocada pelo rompimento de barragens de contenção de resíduos da mineradora Samarco, no interior de Minas Gerais – foi capaz de trazer mais precaução na análise da lei pelo Senado”, lamentou o superintendente de Políticas Públicas e Relações Externas do WWF-Brasil, Henrique Lian, ao assinar o documento. Na semana passada, o WWF-Brasil já havia se manifestado publicamente contra o projeto do senador Romero Jucá. Saiba mais

O senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP) avaliou que o projeto torna o país ainda mais vulnerável a desastres ambientais, como o que ocorreu no início do mês em Mariana (MG), quando uma barragem com rejeitos de mineração se rompeu. O senador disse que o PLS 654 vai na contramão da história ao criar um “rito sumário para o licenciamento ambiental”. (Com informações da Agência Senado).
Leia a íntegra do manifesto:

MANIFESTO EM DEFESA DO LICENCIAMENTO AMBIENTAL NO BRASIL. NÃO AO PLS 654/2015

Não é desistindo do licenciamento ambiental que vamos solucionar os conflitos socioambientais.

O licenciamento ambiental, consolidado há mais de 30 anos na legislação brasileira, é o principal instrumento de prevenção, mitigação e compensação de danos socioambientais, considerado o mais relevante mecanismo da Política Nacional de Meio Ambiente. Um licenciamento aprimorado e bem conduzido, com ampla participação social e aprofundadas análises técnicas, atende a todos os setores da sociedade.

Ao contrário, a sua flexibilização excessiva, como propõe o Projeto de Lei do Senado 654/2015 (autor: senador Romero Jucá), ampliará os conflitos, inclusive os judiciais. O meio ambiente será objeto de maiores riscos, as populações potencialmente impactadas ficarão menos protegidas e com seus direitos ameaçados e os empreendedores terão menos segurança jurídica para operar e mais conflitos a resolver sem a intermediação do Poder Público.

Os mais complexos projetos de infraestrutura, que pressupõem alto grau de impactos socioambientais, são exatamente o conjunto de atividades para as quais o PL atribui menor controle e fiscalização, com a exclusão da obrigação de realizar avaliação consistente de impactos socioambientais, adequada a cada bioma, tipologia de obra, ou de exploração de recursos naturais.

O PL prevê prazos de até 60 dias para a realização de Estudos Ambientais, trazendo como resultado a ausência absoluta de análises adequadas de impactos. Estudos relativos a impactos hidrológicos de barragens, por exemplo, somente podem ser realizados após a observação de pelo menos um ciclo hidrológico completo de um ano. A incorporação de uma “licença ambiental integrada”, que autoriza simultaneamente a instalação e operação de um empreendimento, significa na prática a eliminação do processo de licenciamento ambiental em si.

O Projeto de Lei 654/2015 representa um retrocesso da democracia brasileira na medida em que elimina as instâncias de participação cidadã no licenciamento e minimiza o papel dos órgãos fiscalizadores de impactos sociais, como o Ministério da Saúde, a Funai, o ICMBio, a Fundação Cultual Palmares, entre outros. Eliminar os espaços de participação direta de atingidos e interessados é a maneira menos eficiente de encarar os conflitos inerentes às grandes obras de infraestrutura.

O desenvolvimento sustentável, com o qual o governo e vários setores da economia constantemente reafirmam seu compromisso, demanda do país um licenciamento ambiental mais robusto e eficaz, com mais participação e melhores condições aos órgãos competentes para atuar, seja no nível federal, seja no âmbito dos estados e municípios. Não vamos desistir do Licenciamento Ambiental! NÃO ao PL 654/2015, do senador Romero Jucá.


Fonte: WWF Brasil

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