segunda-feira, 29 de fevereiro de 2016

Mulheres, vítimas da política migratória.
Duas vendedoras de frutas, grãos e vegetais, no mercado de rua em Pequeno Haiti, em Santo Domingo, capital da República Dominicana. Elas permitiram ser fotografadas, mas preferiram não falar de sua situação. O medo faz parte da vida das imigrantes haitianas no país. Foto: Dionny Matos/IPS.

Por Ivet González, da IPS – 

Santo Domingo, República Dominicana, 4/2/2016 – Uma mulher prepara ramos de rosas amarelas no mercado de rua em Pequeno Haiti, um bairro pobre da capital da República Dominicana. “Não quero falar, não tire fotos”, pediu à IPS essa trabalhadora, acompanhada de uma menina que parecia ser sua filha.Outras vendedoras do grande mercado informal em que se converteram as ruas do bairro, todas afrodescendentes, também se recusam a conversar.

“Têm medo porque pensam que serão deportadas”, disse, sussurrando, uma comerciante, enquanto mexia um caldo em um fogão à lenha em plena calçada.Esse medo se deve à última onda de deportações, dentro do conflito migratório, algumas vezes aberto e outras escondido, que domina as relações deste país com o Haiti, o mais pobre da América Latina e com sua população majoritariamente negra, com o qual compartilha a ilha caribenha La Espanhola.

Segundo dados oficiais, a Direção Geral de Migração dominicana deportou, entre agosto de 2015 e janeiro de 2016, 15.754 haitianos sem documentos, e regressaram voluntariamente ao seu país outros 113.320, incluídos 23.286 menores de idade. “Esse processo afeta em maior grau as mulheres, porque, quando a identidade dominicana é negada a um filho ou uma filha, as mães são as responsáveis diretas por não ter legalizado sua situação”, explicou à IPS Lilian Dolis, coordenadora do não governamental Movimento de Mulheres Dominicano-Haitiana (Mudha).

“Se a mãe não tem os documentos, então a documentação dos filhosé questionada. E, no caso das migrantes haitianas, não basta se casar com um dominicano, embora a Constituição lhe conceda a nacionalidade do marido. Muitas vezes esse direito é violado, por isso elas ainda carregam uma carga muito tortuosa”, acrescentou a ativista do movimento nascido em 1983.

A mais recente crise migratória começou em 2013, quando uma sentença do Tribunal Constitucional determinou os novos parâmetros para obter a nacionalidade. A medida mais conflituosa é que não são considerados dominicanos os filhos de imigrantes ilegais nascidos no país, inclusive aqueles inscritos no registro civil. As pessoas nessa situação ficam em um limbo sem nacionalidade, ou apátridas, segundo críticas de muitos organismos internacionais.

Com base nessa decisão, o governo promoveu a Lei Especial de Naturalização, que pôde ser aplicada uma única vez, entre 23 de maio de 2014 e 1º de fevereiro de 2015, às filhas e aos filhos de estrangeiros residentes que nasceram em solo dominicano entre 16 de junho de 1929 e 18 de abril de 2007. Durante esse período a norma de regime especial foi aplicada a 8.755 pessoas.
A florista Antonia Abreu, uma das poucas vendedoras ambulantes que aceitaram falar sobre a dura realidade das imigrantes haitianas na República Dominicana, em seu posto de venda no bairro de Pequeno Haiti, em Santo Domingo, capital da República Dominicana. Foto: Dionny Matos/IPS.

Paralelamente, as autoridades implantaram, de 1º de junho de 2014 a 17 de junho de 2015, o Plano Nacional de Regularização de Estrangeiros para todos os imigrantes radicados no país que estivessem em situação irregular. Nesse programa puderam se inscrever 288.466 imigrantes sem documentos, na maioria haitianos, para obter uma autorização de permanência e trabalho. Mas apenas 240 mil cumpriram todos os requisitos e conseguiram status legal.

Desde agosto, as forças policiais realizam contínuas operações e os que não estão com documentos em dia vão para “campos de boas-vindas”, instalados em vários pontos da fronteira para serem devolvidos ao Haiti. “A maioria das haitianas trabalha fora de casa, e poucas têm situação econômica que permita serem donas de casa”, apontou Antonia Abreu, umadominicano-haitiana que há 40 anos vende arranjos de flores para festas, presentes e também funerais no mercado em Pequeno Haiti.

Conhecida pelo seu sobrenome, La Araña contou à IPS que “as mulheres vendem roupas, comida, aplicam perucas, são empregadas doméstica e há trabalhadoras sexuais. Muitas são paleteras (vendedoras ambulantes) que sofrem os abusos da polícia, que apreende seus carrinhos e suas mercadorias quando não têm documentos”. Ela ressaltou que “as que trabalham de forma saudável conseguem se inserir na sociedade e contribuir para o país”.

Entre a rara mescla de odores de especiarias, esgoto a céu aberto, comidas típicas e lixo, muitas mulheres subsistem a duras penas nesse mercado do bairro de maioria haitiana, com a venda de flores, refeições, alimentos crus, roupas, utensílios domésticos e equipamentos eletrodomésticos de segunda mão.O bairro, localizado bem perto de uma grande via comercial e da turística Cidade Colonial de Santo Domingo, está abandonado pelas autoridades municipais, ao contrário de seus pujantes vizinhos.

Isso transformou o local em um submundo onde sobrevive uma população incalculável em um entorno decadente. Entretanto, quase não há criminalidade, destacam moradorese não moradores.A clientela de seus pontos de venda na rua costuma ser de imigrantes haitianos, que trabalham em condições qualificadas como escravidão por organizações internacionais. Também recebe pessoas de renda muito baixa, nesse país de 9,3 milhões de habitantes, onde 33% das famílias vivem na pobreza, de acordo com o Mapa da Pobreza na República Dominicana 2014.
Uma imigrante haitiana no assentamento rural de Mata Mamón, na República Dominicana, onde trabalha como diarista. As mulheres haitianas que trabalham nas fazendas dominicanas são invisíveis, tanto para as estatísticas como para os programas de apoio aos migrantes rurais, denunciam ativistas. 

Foto: Dionny Matos/IPS.

“As imigrantes ilegais não podem trabalhar, nem estudar ou ter uma vida pública. Acabam indo diretamente para o setor do serviço doméstico e trabalho informal. E, mesmo que tenham a documentação, as dominicano-haitianas sempre são excluídas dos projetos sociais”, afirmou Dolis.Neste país de arraigada cultura machista, as haitianas e suas filhas sofrem uma profunda exclusão em virtude de um coquetel de xenofobia, racismo e discriminação de gênero, segundo diferentes estudos e especialistas.

“Elas estão invisíveis. Nem mesmo sabemos quantas são”, lamentou a ativista. “Os dados dos censos não são confiáveis para saber a população dominicana de ascendência haitiana e a pesquisa do Fundo de População das Nações Unidas (UNFPA) já está desatualizada” apontou.Dessa forma Dolis se referiu aos últimos dados sobre a matéria, colhidos pela Pesquisa Nacional de Imigrantes, que o estatal Escritório Nacional de Estatísticas realizou em 2012 com apoio do UNFPA.

O estudo estimou que na época viviam em território dominicano cerca de 560 mil imigrantes, dos quais 458 mil nascidos no Haiti.A falta de estatísticas é um obstáculo ao trabalho do Mudha, que está presente em quatro províncias e cinco municípios dominicanos, com suas mensagens e ações para reivindicar os direitos das mulheres dominicano-haitianas, com ênfase nos sexuais e reprodutivos.

O movimento é liderado por um coletivo de 19 mulheres e conta com 62 promotoras, que realizam atividades em comunidades urbanas e rurais. Com seu acompanhamento, o grupo beneficia de maneira indireta mais de seis mil pessoas. A Mudha assegura que o Estado dominicano nunca reconheceu as mulheres haitianas e suas filhas como sujeitos de direito. “Sempre se falou da imigração de trabalhadores braçais, mas nunca das trabalhadoras braçais, ou seja, as mulheres que acompanhavam os seus maridos ou vinham, e vêm, para realizar esse trabalho”, pontuou Dolis.

Fontes históricas identificam, desde antes de 1844, a presença de trabalhadores braçais haitianos nos bateyes (assentamentos ao redor de usinas de açúcar), que suportaram sobre seus ombros os duros trabalhos no cultivo da cana e na produção de açúcar, o motor durante séculos da economia dominicana.Atualmente, a força de trabalho haitiana no país é importante demais no setor agrícola, nos ramos da construção, manufatura, hotelaria e comércio.


Fonte: ENVOLVERDE
Inteligência Coletiva em Sustentabilidade.
Programa se consolida como um dos mais respeitados Selos de Sustentabilidade do país que reconhece, certifica e compartilha as melhores práticas socioambientais das instituições brasileiras. 

Empresas e gestores com boas práticas socioambientais podem inscrever seus cases até 31 de março.

Mais de 180 Organizações já tiveram seus cases certificados pelo programa Benchmarking que está na 14ª edição. Muitas delas com vários cases certificados, conseguindo se manter presente no Ranking por anos seguidos dado ao volume e qualidade de suas boas práticas. Na outra ponta do processo, mais de 190 especialistas de vários países se renovam anualmente para compor a comissão técnica que seleciona e pontua os cases Benchmarking. Até o momento 339 cases com foco em 10 diferentes temáticas da gestão socioambiental obtiveram score para serem reconhecidos como Benchmarking pela excelência das práticas adotadas. E como resultado final, todo este conhecimento aplicado desenvolvido pelas melhores cabeças da sustentabilidade foi compartilhado em Bancos Digitais, Publicações e Eventos Técnicos atingindo ao longo do período mais de 80 mil pessoas atuantes e envolvidas com sustentabilidade. Para pertencer a comunidade Benchmarking, uma iniciativa independente, e, fazer parte da inteligência coletiva em sustentabilidade, a organização tem que abrir suas práticas para um público especializado e ativista. A comissão técnica da 14ª edição conta com nomes consagrados de lideranças e especialistas de 5 diferentes países, e a metodologia de seleção de cases tem o reconhecimento da ABNT.

Empresas Inteligentes tratam a sustentabilidade como uma nova fronteira de inovação

O Programa incentiva a inovação e a competividade nas práticas de sustentabilidade.Os cases Benchmarking são aqueles que comprovam benefícios efetivos para o ambiente natural, social e econômico. São avaliados por especialistas, cientistas, ativistas e lideranças de comprovado conhecimento e envolvimento de causa, que pontuam quesitos do case sem ter acesso ao nome da organização. Os cases Benchmarking também podem participar da mais nova modalidade do Programa – Benchmarking Indicadores, que seleciona e reconhece os cases que melhor uso fizeram da adoção de indicadores de sustentabilidade de padrão internacional. Todo este cuidado e atenção é para proporcionar aprendizados, acelerar avanços e up grades na gestão socioambiental brasileira. Empresas e gestores com boas práticas socioambientais podem inscrever seus cases até 31 de março pelo site do programa.

Sobre o Programa Benchmarking Brasil

O Programa se consolidou como um dos mais respeitados Selos de Sustentabilidade do país – reconhece, certifica e compartilha as melhores práticas socioambientais das instituições brasileiras. Com metodologia própria reconhecida pela ABNT, já certificou 339 práticas de 182 instituições de 26 diferentes ramos de atividades. Até o momento, aproximadamente 200 especialistas de mais de 20 diferentes países participaram da comissão técnica que seleciona e certifica os cases Benchmarking. 

É inteligência coletiva em sustentabilidade com 3 livros publicados e mais de 60 encontros técnicos realizados, além de 11 edições veiculadas da Revista Benchmarking. Em 2013, o Programa foi o grande vencedor (1o colocado) na categoria Humanidades do Prêmio von Martius de Sustentabilidade da Câmara Brasil Alemanha. Em 13 edições já realizadas construiu e detém o maior banco de boas práticas socioambientais certificadas e com livre acesso do país. É considerado a fotografia da gestão socioambiental brasileira registrando seu nível de maturidade e evolução em sustentabilidade. Inscrições de cases para concorrer a certificação Benchmarking que define o XIV Ranking dos detentores das melhores práticas socioambientais do Brasil até 31 de março.


Fonte: ENVOLVERDE
Decisão nos EUA não ameaça acordo do clima.
Foto: Nick Humphries/Flickr/Creative Commons.

Casa Branca e ativistas reagem à suspensão do plano de energia limpa pela Suprema Corte; analistas dizem que interrupção não põe em risco redução de emissões nem decisão de Paris.

Por Redação do OC –

A decisão da Suprema Corte dos Estados Unidos de suspender temporariamente o plano de energia limpa não ameaça o acordo do clima de Paris nem o avanço das fontes renováveis, dizem analistas. O plano é um trunfo de Barack Obama para reduzir emissões de gases de efeito estufa na geração de energia – 32% em 2030 em relação aos níveis de 2005. Isso implica no fechamento de centenas de usinas de carvão e expansão das fontes renováveis.

A suspensão se deve à enxurrada de ações judiciais que questionam a legalidade do plano – 29 ao todo, apresentadas pelas indústrias e por estados dependentes economicamente das usinas de carvão. A decisão da Suprema Corte paralisa o plano até que o mérito da questão seja decidido, o que deve acontecer até o meio do ano.

Analistas dos Estados Unidos reconhecem a importância do plano e enxergam a decisão da corte norte-americana como um “solavanco” na estrada, mas dizem que o acordo de Paris não está ameaçado. “A administração EUA tem sido absolutamente clara sobre o seu apoio ao acordo de Paris e seu compromisso para alcançar os seus objetivos climáticos em 2025”, declarou David Waskov, diretor de clima do WRI (World Resources Institute).

Além disso, os especialistas ressaltam que o sucesso do acordo não depende só de decisões dos Estados Unidos, já que foi construído com a participação de mais de 190 países, o que faz a decisão mais forte. O mercado de renováveis também está em ascensão, graças aos custos mais baixos de implantação. Porém, os analistas alertam para o comportamento da indústria que se opõe à redução de emissões, além dos políticos contrários ao plano e negacionistas do aquecimento global.

Em nota, a Casa Branca reagiu à decisão e afirmou ser contra a interrupção do plano enquanto correm as ações judiciais. “O plano de energia limpa tem uma base legal e técnica forte, dá aos estados o tempo e a flexibilidade que necessitam para desenvolver planos adequados e com bom custo-benefício para reduzir suas emissões”, diz o comunicado. A nota também defende que o programa vai entregar melhor qualidade do ar, atrair investimentos em energia limpa, criar postos de trabalho e grandes progressos para enfrentar as mudanças climáticas. O governo norte-americano afirmou ainda que continuará dando passos agressivos para progredir na redução de emissões.

De acordo com a Casa Branca, a EPA (Agência de Proteção Ambiental dos EUA) sinalizou que trabalhará junto aos estados que desejem continuar o plano mesmo com a suspensão. “Nós estamos desapontados que o plano tenha sido interrompido, mas vocês não podem interromper as mudanças climáticas e não podem interromper a ação pelo clima”, declarou a agência em nota no Twitter. “Nós acreditamos firmemente neste plano e continuaremos trabalhando com nossos parceiros para resolver a poluição por carbono.”

Agência de Proteção Ambiental norte-americana reage à decisão da Suprema Corte em sua conta no Twitter

A decisão de suspender o plano sem o julgamento do mérito da questão não tem precedentes, de acordo com analistas dos EUA. “A ação altamente incomum da Suprema Corte vai contra o senso comum”, disse em nota Sam Adams, diretor da campanha de clima do WRI nos Estados Unidos. “Os especialistas concordam que o plano de energia limpa tem uma base legal sólida e prevalecerá com base no mérito.” Adams diz que espera que a decisão seja apenas um “intervalo” para o planejamento da plena implementação.

O WWF dos Estados Unidos também reagiu à decisão. “Embora a decisão tenha apertado temporariamente o botão de pausa no plano de energia limpa, não freou o movimento de nossa nação para mudar para energia renovável e combater a mudança climática.”

Os processos em curso questionam a legitimidade da EPA para atuar em questões referentes à emissão de gases de efeito estufa. A agência tem um histórico recente de vitórias judiciais. Em janeiro, a justiça do Distrito da Columbia negou o embargo ao plano de energia limpa, o que gerou recurso dos oponentes ao plano na Suprema Corte, onde o programa foi suspenso por 5 votos a 4. No Congresso, os republicanos têm atacado as medidas desde o seu anúncio, em 2014, sob o argumento de risco à economia e eliminação de empregos.


Com menos emissões, agricultura supera em mais de 60 vezes eficiência da pecuária.
Foto: Shutterstock

Estudo do Imaflora compara produção de energia e proteína dos dois setores e conclui que a produção agrícola supera a pecuária, mesmo com menos área que a pastagem.

Por Redação do Imaflora – 

Estudo do Imaflora converteu toda a safra agropecuária brasileira em proteína e energia para visualizar, pela primeira vez, a participação da agricultura e da pecuária para o fornecimento dos elementos fundamentais para a alimentação humana. A conclusão é que a agricultura supera em mais de 60 vezes a eficiência da pecuária em produção de proteína, mesmo com menos áreas que a pastagem e com emissões de gases de efeito estufa (GEE) muito inferiores.

A análise foi feita a partir dos dados das safras de 1975 a 2006 (baseado no Censo Agropecuário do IBGE) e de projeções para 2020. Além do dado agregado nacionalmente, os resultados da safra foram segmentados para cada região do país.

O estudo demonstrou que houve aumento na produção, produtividade e emissões de GEE, tanto na agricultura, quanto na pecuária. Contudo, revelou a grande assimetria entre os dois setores em relação à quantidade e a eficiência de produção de proteína e energia e de emissão de gases de efeito estufa. Os resultados indicam a importância da aceleração das iniciativas para a intensificação e maior eficiência da pecuária no Brasil.

Veja aqui o estudo completo.


Fonte: Imaflora
Bolsa Verde ajuda a proteger ararinhas-azuis.
Ararinhas-azuis voltam para a natureza em 2021. Foto: Divulgação/ACTP

A nona reunião do Comitê Gestor do Programa Bolsa Verde, realizada no final de janeiro no Ministério do Meio Ambiente (MMA), em Brasília, aprovou a criação de um Grupo de Trabalho (GT) para estudar a proposta de incluir no Programa famílias em condições de extrema pobreza e que moram em áreas habitadas por animais ameaçados de extinção.

Por Cristina Ávila e Luciene de Assis, do MMA –

“Entre as áreas que o MMA pretende ter famílias beneficiadas está de Curaçá, onde será feita a soltura de ararinhas-azuis”, revela a diretora do Departamento de Extrativismo do Ministério, Juliana Simões. Ela se refere ao município localizado na região norte da Bahia, local onde o MMA criará uma área de preservação.

Naquela parte da Caatinga, o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) iniciará uma fase de testes a partir de 2017. O objetivo é preparar o terreno e educar ambientalmente a população local para a soltura de aves. Até 2021, um grupo de 150 ararinhas-azuis passará a viver ali em liberdade, numa área de preservação a ser criada.

Curaçá, cidade ao norte da Bahia, é o local de origem das ararinhas-azuis e não tem mais exemplares soltos na natureza. A extinção se deu por conta de capturas ilegais, especialmente por causa do tráfico ilícito de animais silvestres. As aves a serem reintroduzidas em seu ambiente natural nasceram ou foram resgatadas de cativeiros.

Responsabilidade

A reintrodução dos animais no meio ambiente é iniciativa do Projeto Ararinha na Natureza, desenvolvido pelo ICMBio, órgão vinculado ao MMA, em parceria com a ONG alemã Associação para Conservação de Papagaios em Extinção (ACTP) e o Al Wabra Wildlife Preservation (AWWP), um criadouro particular localizado no deserto do Catar, entre outros parceiros.

“O objetivo de inserirmos essas famílias no Bolsa Verde é torná-las parceiras na proteção dos animais ameaçados de extinção. É bom lembrar que o Bolsa Verde significa benefício, mas, também, responsabilidade com o meio ambiente”, acentua Juliana Simões.

A portaria de criação do GT deverá ser publicada em fevereiro, com os detalhes sobre o seu funcionamento. O grupo será constituído por representantes dos Ministérios do Meio Ambiente (MMA), do Desenvolvimento Agrário (MDA), e do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS), além do ICMBio e do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra).

Como funciona

O Programa de Apoio à Conservação Ambiental Bolsa Verde foi lançado em setembro de 2011. O propósito é repassar, a cada trimestre, R$ 300 às famílias em situação de extrema pobreza e que vivem em áreas consideradas prioritárias para conservação ambiental.

O benefício é concedido por um período de dois anos, com possibilidade de renovação. O objetivo é aliar o aumento de renda dessas populações à conservação dos ecossistemas e ao uso sustentável dos recursos naturais.


quinta-feira, 25 de fevereiro de 2016

Floresta regenerada é esponja de carbono.
Estudo de consórcio internacional que inclui cientistas brasileiros mostra que vegetação secundária na América Latina absorve 11 vezes mais CO2 do ar que matas amazônicas maduras.

Por Claudio Angelo, do OC –

As florestas secundárias, que rebrotam após o desmatamento de uma área, são conhecidas pelo nome algo pejorativo de capoeiras. A palavra vem do tupi e significa, literalmente, “mato que não é mais”. 

Vistas como pobres em biodiversidade e jamais tão ricas em estoque de carbono quanto uma floresta primária – a tal “mata virgem”–, as capoeiras são frequentemente desprezadas e outra vez desmatadas. Um estudo lançado hoje, porém, deve ajudar a reduzir esse preconceito.

Um consórcio internacional de cientistas, que inclui gente de diversas instituições de pesquisa do Brasil, acaba de publicar no periódico Nature a maior análise já feita sobre o padrão de crescimento das florestas secundárias na chamada região neotropical, que vai do México ao Estado de São Paulo. 

Eles concluíram que as capoeiras demoram, em média, apenas 66 anos para repor 90% da biomassa (portanto, do estoque de carbono) que possuíam antes do desmatamento. E mais: uma floresta em regeneração sequestra 11 vezes mais carbono do que uma mata virgem na Amazônia.

“Esta é a primeira estimativa da resiliência das florestas secundárias. Sempre houve muita dúvida sobre a taxa de crescimento e a resiliência dessas florestas”, disse ao OC o engenheiro florestal Daniel Piotto, professor da Universidade Federal do Sul da Bahia. Ele é coautor do trabalho, coordenado pelo holandês Lourens Poorter, da Universidade de Wageningen.

A importância das capoeiras da América Latina para o ciclo do carbono e, portanto, para o clima, é evidente. Somente na Amazônia, 22% de toda a área desmatada é ocupada por matas em regeneração, segundo dados do Terraclass, do Inpe. Esse número é provavelmente ainda maior na Mata Atlântica, que tem menos de 10% de sua cobertura florestal original.

No entanto, essa importância nunca havia sido traduzida em números antes. Estudos pontuais mostravam ora que as florestas poderiam entrar em colapso a partir de um certo grau de desmatamento, ora que o crescimento de uma floresta secundária era lento demais para fazer alguma diferença no clima no curto prazo.

“Meus estudos na Zona Bragantina, no leste do Pará, mostravam um tempo de recuperação de 150 anos. Estudos feitos na Venezuela chegavam a 250 anos. A meta-análise [o novo estudo] aponta 66 anos”, diz Ima Vieira, pesquisadora do Museu Paraense Emílio Goeldi e uma das maiores especialistas em florestas secundárias do país. Ela também é coautora do trabalho, realizado pelo consórcio autointitulado Amantes da Floresta Secundária – ou “2ndFOR” (“SecondFor”, em inglês), para os menos íntimos.

Os dados anteriores não estão necessariamente errados. O que acontece é que há uma variação gigantesca de tempo de regeneração dentro da zona neotropical, com capoeiras crescendo mais rápido em regiões onde chove mais e onde há mais florestas intactas em volta.

“De posse dessa taxa de crescimento, será possível fazer previsões sobre o potencial de mitigação [de emissões de gases de efeito estufa] das florestas secundárias”, afirma Piotto. O 2ndFOR já está fazendo essas contas.

Mapa

O consórcio integrou tanto dados coletados pelos pesquisadores em campo quanto resultados de análises anteriores, e produziu um mapa mostrando em que regiões as capoeiras absorvem mais carbono e onde absorvem menos. O mapa poderá ser usado pelos formuladores de políticas públicas para priorizar a conservação em florestas de baixa resiliência e incentivar a regeneração em regiões de crescimento rápido da capoeira.
Imagem mostra velocidade de regeneração, medida em biomassa acumulada em 20 anos. Quanto maior o círculo preto, maior a taxa de crescimento da floresta.

A princípio a notícia é ruim para a Mata Atlântica, já que sua reposição de biomassa é até 70% mais lenta que na Amazônia – e é justamente ali que há mais florestas precisando de regeneração. Piotto diz que isso seria olhar apenas metade do quadro. “Há muito mais áreas disponíveis para recuperar na Mata Atlântica do que na Amazônia”, afirma.

O estudo deverá ter também implicações para o cumprimento da meta do Brasil para o Acordo de Paris. A chamada INDC aposta na recuperação de florestas como forma de sequestrar carbono e compensar o que se emite pelo desmatamento legal na Amazônia. O leste do Pará é uma das regiões onde mais vale a pena deixar o mato crescer.

Mas isso só se deixarem mesmo o mato crescer. “Se essas florestas vão resistir no campo depende de questões políticas e institucionais que vão além da nossa pesquisa”, afirma Ima Vieira. “No que depender dos produtores rurais, não vão, porque eles as veem como empecilho.”

O Pará é o único Estado da Amazônia que tem uma lei que protege as capoeiras, definindo estágios de sucessão (crescimento) e vedando o desmatamento em capoeiras de crescimento avançado.

Mesmo no Pará, Vieira estima que 50% das capoeiras sejam recentes – portanto, passíveis de desmatamento legal.

Segundo a pesquisadora, preservar as florestas secundárias é importante, mas fundamental mesmo é não desmatar as primárias. “A capoeira não vai recuperar a biodiversidade”, diz. “Elas levam 66 anos em média para recuperar 90% da biomassa, mas 70 anos para recuperar 35% das espécies de árvores nativas.”


Nova versão do Registro Público de Emissões.
Foto: Shutterstock

Plataforma para organizações empresariais e não empresariais ajuda a criar bases para transição à economia de baixo carbono. Interessados em utilizar a ferramenta serão capacitados em fevereiro.

Por Redação da Envolverde –

O Programa Brasileiro GHG Protocol lança em março a versão 2.0 de seu Registro Público de Emissões (RPE). A plataforma é a maior base pública de inventários de GEE (gases de efeito estufa) da América do Sul, com 133 empresas-membro em 2015.

Criada em 2008, a plataforma é uma iniciativa do GVces da FGV/EAESP (Centro de Estudos em Sustentabilidade da Escola de Administração de Empresas de São Paulo da Fundação Getulio Vargas) e do WRI (World Resources Institute), com a parceria do Ministério do Meio Ambiente, do Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável (CEBDS), do World Business Council for Sustainable Development (WBSCD) e de 27 empresas fundadoras.

O lançamento atende a uma sinalização do Acordo de Paris por 195 nações, que apresenta as bases para uma nova fase na transição mundial em direção a uma economia de baixo carbono. Isso exigirá, em um futuro próximo, mecanismos que garantam transparência no acompanhamento das ações de reduções de emissão de GEE – incluindo sistemas de mensuração, relato e verificação (MRV). O acordo também enfatizou o papel que os governos subnacionais devem assumir no combate às mudanças climáticas, o que tende a acelerar e ampliar o estabelecimento de sistemas MRV em nível estadual, como já acontece no Brasil.

A nova versão do RPE tornará possível a integração de dados de emissões empresariais com futuros sistemas de plataformas mandatórias ou voluntárias, de modo que as empresas participantes possam antecipar-se ao processo. “Com tantos mecanismos de relato de informações como temos hoje, as empresas já gastam muito tempo replicando dados em diferentes plataformas. Hoje as informações geradas através do GHG Protocol são utilizadas no relato que as empresas fazem no CDP, ISE, ICO2, DJSI[1], entre outros”, aponta o coordenador do Programa Brasileiro GHG Protocol, George Magalhães. “Muito em breve, as empresas e outras organizações participantes do programa poderão, com um clique, enviar para outras plataformas as informações, que voluntariamente, já publicam nos seus inventários de GEE”, acrescenta.

Público-alvo e inscrições

A nova versão do Registro Público de Emissões estará disponível para as empresas membros do Programa Brasileiro GHG Protocol e para as demais empresas que têm interesse em aderir ao programa. Todas receberão treinamento a partir de 22 e 23 de fevereiro sobre o método GHG Protocol – atualmente o mais utilizado no mundo para realização de inventários de GEE de organizações empresariais e não empresariais.

As inscrições para a primeira turma a ser capacitada na metodologia e na nova plataforma já estão abertas. Informações pelo tel. (11) 3799-4150 e e-mail ghgprotocolbrasil@fgv.br – ou acesse www.ghgprotocolbrasil.com.br. (GVces/ #Envolverde)

* Com informações do GVces da FGV/EAESP.


Fonte: ENVOLVERDE
Como era o Brasil há 100 milhões de anos.
Estudo estabelece a cronologia de eventos tectônicos e climáticos nas bacias sedimentares Bauru, Sanfranciscana e dos Parecis, na região Centro-Sul do país. Foto: Wikimedia Commons.

Por Peter Moon, da Agência Fapesp –

Há 140 milhões de anos, no início do período Cretáceo, o Brasil era coberto por um vastíssimo deserto de dunas muito maior que o Saara. Este deserto desapareceu ao ser engolido por um oceano de larva produzido pelo maior extravasamento de magma dos últimos 500 milhões de anos. Sete entre as dez maiores erupções vulcânicas – inclusive as três maiores – que ocorreram no planeta neste período aconteceram no Sudeste brasileiro. O panorama geológico que os pesquisadores brasileiros estão compondo de nosso país é estarrecedor.

O mais recente trabalho que procura atar três peças basilares desse quebra-cabeça colossal, as três bacias geológicas que sustentam a porção Centro-Sul do território brasileiro, acaba de ser publicado no Journal of South American Sciences. Um de seus autores é o geólogo Alessandro Batezelli, do Instituto de Geociências da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). O projeto teve o apoio da Fapesp.

O foco do estudo de Batezelli são as bacias sedimentares do Centro-Sul do Brasil, com destaque para as bacias Bauru, Sanfranciscana e dos Parecis. Entender o modo como os eventos tectônicos e climáticos interagiram em cada uma delas no tempo e no espaço ajuda a estabelecer uma sequência cronológica.

A descoberta daqueles eventos não foi obra de Batezelli e do geógrafo Francisco Sergio Bernardes Ladeira, o coautor do trabalho. Mas é a sua pesquisa, assim como a de outros profissionais, que nos permite tecer um esboço do drama geológico que se desenrolou no Centro-Sul brasileiro entre 135 e 60 milhões de anos atrás.

A ruptura de Gondwana

No período Jurássico, entre 201 e 145 milhões de anos atrás, a América do Sul e a África encontravam-se unidas. Ficavam bem no meio do antigo megacontinente Gondwana. As correntes de ar saturadas de umidade do antigo oceano Pantalássico não tinham força para atingir o distante centro de Gondwana. Daí a formação de um imenso deserto, o deserto Botucatu. É o mesmo processo que se vê hoje na Ásia Central, cujo clima desértico se deve à sua grande distância dos oceanos.

Quase não há fósseis preservados do Jurássico no Brasil. Explicações, para tanto, seriam o clima inóspito do deserto e também a difícil preservação de fósseis num ambiente de dunas. No entanto, o deserto Botucatu não era desabitado. Até agora, foram achadas apenas algumas pegadas fossilizadas de mamíferos e de répteis.

Há 140 milhões de anos, a América do Sul e a África começaram a se separar para dar início à abertura do Atlântico Sul. “O fenômeno que provocou a ruptura de Gondwana foi o surgimento de fraturas profundas na crosta terrestre”, diz Batezelli. Por essas fraturas começou a extravasar magma do interior do planeta em quantidades descomunais. À medida que as fendas iam se alargando, e os continentes se afastando, mais lava extravasava, num processo contínuo e muito prolongado, que perdurou de 137,4 a 128,7 milhões de anos atrás.

O epicentro desta megaerupção vulcânica, “ou mais apropriadamente um megaextravasamento basáltico, conhecido como Província Vulcânica Paraná-Etendeka,” como observa o geólogo, foi o Sudeste e o Sul do Brasil, que se encontravam ligados às terras da atual Namíbia, na África.

A Província Vulcânica Paraná-Etendeka foi formada a partir de diversas fendas, ou megavulcões, os maiores de que se têm notícia. Não eram vulcões explosivos, como os que estamos acostumados a ver. “Não havia erupções explosivas. As fendas jorravam continuamente”, diz Batezelli. “Daqui até a África havia fendas através das quais a lava extravasou sobre uma área gigantesca e por um período muito prolongado.” Através daquelas fendas transbordaram 2,3 milhões de km3 de lava, que cobriram totalmente 1,5 milhão de km2 – equivalente a cobrir o Estado do Amazonas, o maior do país, com uma camada de lava de 1,5 km de altura.

A origem do aquífero Guarani

Toda essa lava enterrou as antigas dunas do deserto Botucatu e foi-se acumulando em camadas sucessivas até erigir a Serra Geral, que cobre os Estados do Paraná, Santa Catarina e o norte do Rio Grande do Sul – além do leste paraguaio e o norte da Argentina. Sua areia foi cozinhada a uma temperatura de 1.200 graus centígrados e prensada pelo peso do magma. A areia acabou virando arenito, uma rocha bastante porosa que tem a propriedade de armazenar a água da chuva que é absorvida pelo solo.

No caso das dunas do deserto Botucatu, elas deram origem ao aquífero Guarani, um dos maiores reservatórios subterrâneos de água doce do planeta, enterrado sob o chão do Centro-Sudoeste do Brasil. O aquífero Guarani comporta 37 mil km3 de água, equivalente a 1,6 vez o volume do maior lago do planeta, o Baikal, na Sibéria.

“Nas regiões onde as dunas entraram em contato direto com a lava, houve um aumento de temperatura tão grande que os sedimentos foram literalmente cozidos, formando um arenito mais duro e impermeável, que é usado hoje nas calçadas de mosaico português”, diz Batezelli. Já a lava resfriada formou basalto, e este, desgastado por cem milhões de anos de erosão, deu origem à terra roxa, o solo fértil que alavancou no século XIX as lavouras de café em São Paulo e no Paraná.

Um novo deserto

Há 128,7 milhões de anos, quando os extravasamentos de magma findaram, aquele gigantesco acúmulo de rocha vulcânica fez com que parte do Sudeste brasileiro sofresse um abatimento sob seu próprio peso, o que criou na superfície uma nova bacia sedimentar, a Bacia Bauru. E sobre esta bacia formou-se um novo deserto de dunas, porém menor que o anterior.

O Atlântico Sul mal começara a abrir. Ainda nem era um braço de mar, no máximo uma depressão alagada para onde convergiam os rios, os sedimentos e a erosão de dois continentes. Ou seja, as águas de Pantalassa – o oceano que rodeava a Pangeia – ainda estavam longínquas, assim como sua brisa úmida. Para acabar com as condições de secura do Centro-Sul do Brasil, seria preciso aguardar outros 60 milhões de anos, quando o Atlântico Sul, embora com menos da metade da abertura atual, pôde amenizar o clima.

De qualquer forma, aquela depressão que lentamente se alargava um par de centímetros por ano já ia se fazendo sentir no clima. O novo deserto de dunas, agora denominado Grupo Caiuá, não era tão grande como o antigo deserto Botucatu, afirma Batezelli. Era árido, mas pontilhado aqui e ali por oásis infestados de várias espécies de crocodilos terrestres, parentes extintos dos crocodilianos atuais.

Aqueles crocodilos viviam em terra firme, tinham patas longas e andavam como lobos. Os paleontólogos já descreveram mais de uma dúzia de espécies. A mais famosa é o famigerado baurusuchus, uma fera predadora. Mas havia também formas bizarras, com chifres ou com uma carapaça semelhante à dos tatus, como a do armadillosuchus, e até um crocodilo herbívoro, o esfagessauro.

As dunas do Caiuá existiram entre 125 e 100 milhões de anos atrás, quando cederam lugar a uma nova paisagem formada por rios e lagos. “O clima se tornou muito mais ameno, similar ao semiárido da Caatinga nordestina”, diz Batezelli. Essa nova depressão recebeu sedimentos que hoje pertencem ao Grupo Bauru, que existiu entre 80 e 60 milhões de anos atrás.

Aí sim os titanossauros proliferaram. A maioria das espécies brasileiras é dessa fase. Seus fósseis homenageiam o nome das cidades mineiras e paulistas próximas das quais foram encontrados, como uberabatitan e baurutitan.

A Bacia Sanfranciscana

Concomitante a estes 60 milhões de anos de transformações na Bacia Bauru, “mais para o norte, na Bacia Sanfranciscana, ocorreram fenômenos muito parecidos, embora sem serem os mesmo”, salienta Batezelli. A Bacia Sanfranciscana engloba o oeste de Minas Gerais, Goiás, Tocantins e o oeste da Bahia, estendendo-se até o sul do Piauí.

Durante o Cretáceo inferior, na Bacia Sanfranciscana se desenvolveram campos de dunas eólicas. 

Dezenas de milhões de anos depois, já no Cretáceo superior, também aconteceu vulcanismo. “Bem no limite entre as bacias Bauru e Sanfranciscana se formaram diversos vulcões”, revela Batezelli pautado em sua pesquisa. “Eles apresentaram um extravasamento bem menor do que o vulcanismo que deu origem à Serra Geral, porém foram responsáveis por formar uma região mais elevada entre as Bacias Bauru e Sanfranciscana. Foi como se a crosta inchasse por causa do calor das intrusões magmáticas.”

Seu relevo é perceptível até hoje, nas crateras no interior das quais estão as cidades de Araxá, Tapira e Poços de Caldas. “As grandes jazidas de nióbio assim como outras riquezas minerais do sudeste de Minas Gerais estão relacionadas a este vulcanismo.”

O vulcanismo na Bacia Sanfranciscana ocorreu há menos de 100 milhões de anos atrás. A maior parte da lava que extravasou desses vulcões avançou sobre as dunas.

A evolução da Bacia dos Parecis é semelhante ao ocorrido nas bacias Bauru e Sanfranciscana. Ainda no período Jurássico superior, ocorreu um vulcanismo modesto nos Parecis. Há 145 milhões de anos atrás, já no Cretáceo superior, formaram-se rios e lagos na região compreendida entre o norte do Mato Grosso e o oeste de Rondônia. Com o passar do tempo o clima foi se tornando mais árido e o cenário paisagístico se transformou num campo de dunas.

Em resumo, e comparando os cenários das três bacias sedimentares, conclui-se que do Cretáceo inferior ao Cretáceo superior, um período de mais de 60 milhões de anos, houve um deslocamento dos desertos de dunas no território brasileiro das direções sudeste para noroeste.

Das dunas eólicas aos rios e lagos

Durante o Cretáceo inferior, a região Sudeste era dominada por uma paisagem desértica formada por dunas eólicas. Já no Cretáceo superior, a maior parte da região Sudeste passou a ter uma paisagem constituída por rios e lagos, enquanto que desertos de dunas surgiram no norte de Minas, em Goiás, Tocantins, Matogrosso e Rondônia. “Isso demonstra que, com o passar do tempo, houve uma diminuição nas condições de umidade de sul/sudeste para o centro-oeste/norte do Brasil”, revela Batezelli.

Todo o drama geológico descrito acima se desenrolou em paralelo ao alargamento do Atlântico Sul. Suas brisas que cresciam em volume e intensidade semeavam cada vez mais umidade na porção sudeste do continente.

Esse era o cenário dominante quando da extinção em massa do fim do Cretáceo, há 65 milhões, que deu fim aos dinossauros. Esse legado geológico, geográfico e climático formou o novo meio ambiente no qual os mamíferos da era Cenozoica puderam se adaptar. Mas esta é uma outra história.

O artigo Stratigraphic framework and evolution of the Cretaceous continental sequences of the Bauru, Sanfranciscana, and Parecis basins, Brazil, de Betezelli e Ladeira, publicado no Journal of South American Earth Sciences, pode ser lido aqui.