segunda-feira, 8 de janeiro de 2018

Comportamento de peixes é bioindicador para risco ambiental.
Por Ivanir Ferreira , para o Jornal da USP – 

Nova abordagem permitiu contestar concentrações de poluentes consideradas seguras pelas agências ambientais.

Pesquisa feita na USP estuda comportamento de peixes para avaliar risco ambiental e detecção de poluente aquáticos. A nova abordagem é considerada inovadora e contesta, inclusive, concentrações consideradas seguras de poluentes das Agências Ambientais, que têm a função de controlar e monitorar regularmente os níveis de poluentes no corpo hídrico.

O descarte indiscriminado de substâncias tóxicas em rios, lagos e mares é uma fonte de estresse para os organismos aquáticos. Nestas condições, os peixes naturalmente migram para áreas menos afetadas pelos poluentes. Segundo o pesquisador e biólogo Daniel Clemente, que defendeu tese sobre o assunto no Instituto de Biociências da USP, este fenômeno afeta o equilíbrio ecossistêmico e pode gerar uma redução da população de peixes, causando uma possível extinção local de alguns organismos, explica.
Câmaras utilizadas para avaliar o comportamento dos peixes mediante a exposição de poluentes aquáticos – Foto: cedida pelo pesquisador.

Na pesquisa realizada no laboratório de Ecotoxicologia, da Escola de Engenharia de Lorena (EEL) da USP, sob a supervisão da professora Teresa Paiva, foram analisadas várias substâncias tóxicas de interesse ambiental: o bisfenol, a atrazina, o triclosan e o cobre. Segundo o biólogo, cada país possui uma legislação específica sobre o uso das substâncias e as concentrações máximas permitidas nos corpos hídricos.
Substâncias tóxicas jogadas em rios, lagos e mares geram estresse no hábitat dos peixes, o que resulta em uma migração natural para áreas menos afetadas pelos poluentes – Foto: Wikimedia Commons.

Das substâncias analisadas, muitas delas já foram banidas no exterior. É o caso do bisfenol que teve seu uso proibido no Canadá, na Dinamarca, na Costa-Rica e em alguns estados norte-americanos, mas no Brasil, continua sendo utilizado por empresas na produção de garrafas plásticas, pratos e vasilhas domésticas, mamadeiras, brinquedos, dentre outros produtos. O bisfenol é considerado um desregulador endócrino. Os peixes usados na pesquisa foram o Dario rerio e o Poecilia retícula, popularmente conhecidos como peixe-zebra e barrigudinho, respectivamente.

A pesquisa

Para observar a migração dos peixes, o biólogo utilizou um sistema formado por várias câmaras de vidro, onde foram colocados os peixes juntamente com diferentes gradações de poluentes, sendo que em algumas com concentrações abaixo das permitidas pelas agências ambientais. Embora os peixes tenham ficados expostos aos poluentes por até quatro horas, logo nos primeiros minutos, eles já começaram a migrar para as câmaras que tinham menos poluentes.
Esquema de câmaras utilizadas para avaliar o comportamento dos peixes mediante a exposição de poluentes aquáticos – Imagem: cedida pelo pesquisadorSobre o bisfenol, o estudo detectou que mesmo estando abaixo das concentrações consideradas seguras pelas agências ambientais, de um micrograma por litro de água, a substância causou grande impacto no ambiente e na população aquática, fazendo com que os peixes migrassem para áreas com menores concentrações do composto. 

Os métodos utilizados pelas agências ambientais não consideram concentrações que causam distúrbios ao ambiente aquático. Levam em conta apenas concentrações que causam efeitos tóxicos aos organismos aquáticos e aos humanos. Desta forma, Clemente acredita que o método de análise de fuga de peixes expostos em ambientes poluídos contribui para um melhor entendimento dos riscos ambientais causados pelos poluentes em corpos hídricos, conclui.

A pesquisa feita na USP foi baseada em um método desenvolvido pelo professor Rui Ribeiro e Matilde Moreira-Santos, da Universidade de Coimbra, Portugal, e adaptado pelo pesquisador Cristiano V. M Araujo. A tese Efeitos de poluentes aquáticos na seleção e habitat e distribuição espacial em peixes: uma abordagem complementar aos testes ecotoxilógicos tradicionais foi defendida em dezembro no Instituto de Biociências (IB), sob orientação do professor Marcelo Luiz Martins Pompêo. Daniel Clemente também publicou dois artigos junto com o pesquisador Cristiano Araújo e outros colaboradores no periódico internacional Chemosphere, sendo um deles: Habitat fragmentation caused by contaminants: atrazine as a chemical barrier isolating fish populations.

Mais informações: e-mail clemente.daniel@ib.usp.br, com Daniel Clemente Vieira Rego da Silva


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